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O rei da vela, de Oswald de Andrade O Rei da vela de Oswald de Andrade José Oswald de Sousa Andrade

terça-feira, 3 de abril de 2012

São Paulo, 11 de janeiro de 1890 — São Paulo, 22 de outubro de 1954 foi um escritor, ensaísta e dramaturgo brasileiro. Era filho único de Jose Oswald Nogueira de Andrade e de Inês Henriqueta Inglês de Sousa Andrade. Seu nome pronuncia-se com acento na letra a (Oswáld).
Foi um dos promotores da Semana de Arte Moderna que ocorreu 1922 em São Paulo, tornando-se um dos grandes nomes do modernismo literário brasileiro. Foi considerado pela crítica como o elemento mais rebelde do grupo, sendo o mais inovador entre estes.
Um dos mais importantes introdutores do Modernismo no Brasil foi o autor dos dois mais importantes manifestos modernistas, o Manifesto da Poesia Pau-Brasil e o Manifesto Antropófago, bem como do primeiro livro de poemas do modernismo brasileiro afastado de toda a eloqüência romântica, Pau-Brasil.
Muito próximo, no princípio de sua carreira literária, da pessoa de Mário de Andrade, ambos os autores funcionaram como um dínamo na introdução e experimentação do movimento, unidos por uma profunda amizade que durou muito tempo.
Porém, possuindo profundas distinções estéticas em seu trabalho, Oswald de Andrade foi também mais provocador que o seu colega modernista, podendo hoje ser classificado como um polemista. Nesse aspecto não só os seus escritos como as suas aparições públicas serviram para moldar o ambiente modernista da década de 1920 e de 1930.
Foi um dos interventores na Semana de Arte Moderna de 1922. Esse evento teve uma função simbólica importante na identidade cultural brasileira. Por um lado celebrava-se um século da independência política do país colonizador Portugal, e por outro conseqüentemente, havia uma necessidade de se definir o que era a cultura brasileira, o que era o sentir brasileiro, quais os seus modos de expressão próprios. No fundo procurava-se aquilo que Herder definiu como alma nacional (volksgeist). Esta necessidade de definição do espírito de um povo era contrabalançada, e nisso o modernismo brasileiro como um todo vai a par com as vanguardas européias do princípio do século, por uma abertura cosmopolita ao mundo.
Na sua busca por um caráter nacional (ou falta dele, que Mário de Andrade mostra em Macunaíma), Oswald, porém, foi muito além do pensamento romântico, diferentemente de outros modernistas. Nos anos vinte Oswald voltou-se contra as formas cultas e convencionais da arte. Fossem elas o romance de idéias, o teatro de tese, o naturalismo, o realismo, o racionalismo e o parnasianismo (por exemplo: Olavo Bilac). Interessaram-lhe, sobretudo, as formas de expressão ditas ingênuas, primitivas, ou um certo abstracionismo geométrico latente nestas, a recuperação de elementos locais, aliados ao progresso da técnica.
Foi com surpresa e satisfação que Oswald de Andrade descobriu, na sua estada em Paris na época do Futurismo e do Cubismo, que os elementos de culturas até aí consideradas como menores, como a africana ou a polinésia, estavam a ser integrados na arte mais avançada. Assim, a arte da Europa industrial era renovada com uma revisitação a outras culturas e expressões de outros povos. Oswald percebeu-se que o Brasil e toda a sua multiplicidade cultural, desde as variadas culturas autóctones dos índios até a cultura negra representavam uma vantagem e que com elas se poderia construir uma identidade e renovar as letras e as artes. A partir daí, volta sua poesia para um certo primitivismo e tenta fundir, pôr ao mesmo nível, os elementos da cultura popular e erudita.

O rei da vela, de Oswald de Andrade
O Rei da Vela, peça de Oswald de Andrade, é uma obra representativa da década de 30, e marca uma época de preocupações e compromissos sociais. A peça é considerada o primeiro texto modernista para teatro. Nas experiências inovadoras anteriores, apenas a encenação tinha ares modernistas ao incluir a pintura abstrata nos cenários e afastá-los do realismo e do simbolismo. Mas o texto de Oswald de Andrade trata com enfoque marxista a sociedade decadente, com a linguagem e o humor típicos do modernismo.
Escrito a partir de 1933, depois da crise mundial de 1929, da Revolução de 30 e da Revolução Constitucionalista de 32, o texto manifesta a imensa amargura de Oswald, forçado a percorrer infindáveis escritórios de agiotagem para equilibrar-se financeiramente. Esse seu contato forçado com agiotas foi, provavelmente, a causa da caracterização de um agiota como Rei da Vela. Mas o texto supera a experiência pessoal de Oswald: ele fornece, sem falsas sutilezas, os mecanismos da engrenagem em que se baseia o esquema sócio-econômico do país.
Toda a dramaturgia que veio da crise financeira que abalou Oswald e o fez procurar recursos em escritórios de agiotas, é um laboratório de informações precisas e importantes para a constituição dramatúrgica e estética de seu texto. Os elementos estéticos da cenografia por ele imaginado são evidenciados em suas rubricas, extraídos da situação em que viveu transportadas de forma exemplar para o texto. Evidencia-se o fato da procura de Oswald em vários escritórios, como também os detalhes que o cercavam.
Pelo seu caráter pouco convencional, só foi levada a cena trinta anos depois, integrando o movimento tropicalista. Constitui-se num marco para a cultura brasileira, desencadeador do movimento Tropicalista. Fruto de grandes sínteses estéticas da cena internacional do período consolidou procedimentos que, muitos anos após, seriam considerados pós-modernos.
Quando de sua primeira apresentação, em 1968, o texto causou grande impacto sobre o público. Este se manifestou das mais diversas formas, desde afirmações que definiam o espetáculo como "ridículo e pornográfico" a opiniões que viam nele "uma crítica da atualidade". Não houve, porém, ninguém que permanecesse indiferente.
A peça conta a história de um agiota inescrupuloso, Abelardo I, o Rei da Vela. Com negócios diversificados, sua especialidade são empréstimos. Aproveitando-se da crise econômica que flagela o país, Abelardo empresta dinheiro e cobra juros escorchantes. E ai daquele que se atrever a chamá-lo de usurário. Reforma os títulos, até o dia em que cobra tudo e deixa liso o devedor.
Prepotente, Abelardo pisa em quem pode, mas sabe que é apenas "um feitor do capital estrangeiro". Ingleses e norte-americanos comandam o jogo, no qual brasileiro só faz figuração. Heloísa, por exemplo, deve servir ao Americano, personagem que entra em cena no segundo ato da peça.
A história se inicia no escritório do burguês enriquecido à custa da privação alheia, Abelardo I é um representante da burguesia ascendente da época. Seu oportunismo, aliado a crise da Bolsa de Valores de Nova York, de 1929, permite-lhe todo tipo de especulação: com o café, com a indústria etc. Sua caracterização como o “Rei da Vela” é extremamente irônica e significativa: ele fabrica e vende velas, pois “as empresas elétricas fecham com a crise. Ninguém mais pode pagar o preço da luz”. Também é costume popular colocar uma vela na mão de cada defunto, assim Abelardo I “herda um tostão de cada morto nacional”. Abelardo torna-se então o símbolo da exportação, a custa da pobreza e das superstições populares. Como personagem, ele também denuncia a invasão do capital estrangeiro; daí a irônica consideração sobre “a chave milagrosa da fortuna, uma chave Yale”. No primeiro ato, Oswald demonstra didaticamente varas facetas do personagem: surge Abelardo II, empregado de Abelardo I, que pretende superá-lo. Entra um devedor que Abelardo I explora há anos e decide executar. Vários devedores são mostrados gritando através de uma jaula. Transcorre uma cena em que são examinadas as contas dos clientes, dando uma idéia do funcionamento do escritório em após uma cena com a secretária, entra Heloísa de Lesbos, noiva de Abelardo I.
Heloísa representa a ruína da classe fazendeira. Seu pai, coronel latifundiário, vai à falência, num retrato em que predomina a perversão e o vício, símbolo de uma classe em decadência. A aliança de Abelardo e Heloísa pode, assim, representar a fusão de duas classes sociais corruptas pelo sistema capitalista.
Até mesmo a escolha dos nomes é irônica: Abelardo e Heloísa são dois famosos amantes da Idade Média: ele, um teólogo francês de século XII, ela, sobrinha de um sacerdote. Pouco tem a ver, portanto, com as personagens oswaldianas. Entre os noivos de Oswald, não há idealismo: Heloísa casa-se por interesse, fato sabido por Abelardo I, que também vê vantagens na aliança. Na verdade, Heloísa é membro de uma família da aristocracia rural falida e Abelardo I, da burguesia em ascensão. O casamento entre ambos é uma metáfora: com ele, Oswald simboliza a união entre essas duas classes sociais.
Surge um intelectual, Pinote, e o autor aproveita para mostrar a relação dos intelectuais e artistas com o poder: ou o artista aceita seu compromisso social ou, como Pinote, decide servir à burguesia. Não existe neutralidade possível. Com a saída de Pinote, um diálogo entre Abelardo I e Heloísa volta a defini-los como elementos das classes abastadas, que vivem do suor dos trabalhadores. Em seguida, Abelardo I prepara-se para a chegada do representante do capital estrangeiro, Mr. Jones. A presença de Mr. Jones presença revela um país endividado: “os ingleses e americanos temem por nós. Estamos ligados ao destino deles. Devemos tudo o que temos e o que não temos. Hipotecamos palmeiras... quedas de águas. Cardeais!”
Com esta última personagem, Oswald completa o triunvirato que rege o país: a aristocracia rural (Heloísa) que se une à burguesia nacional (Abelardo I), para melhor servir ao capital estrangeiro (Mr. Jones).
Assim, logo no início do segundo ato, que se passa em uma ilha tropical na Baía de Guanabara, surge Heloísa em franca camaradagem amorosa com Mr. Jones. Oswald utiliza a técnica da concentração de personagens com desvios (em geral sexuais) em uma só família para explicar a decadência da aristocracia rural. Assim, Heloísa de Lesbos possui, como o próprio nome indica, tendências homossexuais. D. Cesarina, sua mãe, mostra-se francamente acessível às investidas amorosas de Abelardo I. Totó Fruta-do-Conde, o irmão homossexual, acaba de roubar o amante da irmã, Joana, sarcasticamente apelidado João dos Divãs. O coronel Belarmino, pai de Heloísa e chefe da família, suspira por um mundo em decadência, o mundo da aristocracia rural. E Perdigoto, outro irmão da moça, bêbado e jogador, é um fascista que planeja organizar uma "milícia patriótica" para conter os colonos descontentes - idéia que interessa a Abelardo I, desde que ela possa ser utilizada para a manutenção da ordem social de que depende sua riqueza.

Os desvios sexuais continuam sendo identificados com a decadência da aristocracia rural. O americano interessa-se pelo chofer e, finalmente, D. Poloca, pilar das tradições aristocratas e virgem com mais de sessenta anos, sente-se tentada a passar uma noite com Abelardo I.
O último ato, tortuoso e alegórico, ocorre no escritório de usura. Abelardo I foi roubado por Abelardo II. Perdeu tudo o que tinha e vai suicidar-se. Abelardo I lembra a Heloísa que ela se casará com Abelardo II, o ladrão. Morre o homem, mas o sistema permanece. Antes de morrer, Abelardo I mostra-se uma personagem consciente ao discutir com Abelardo II, garantindo que a burguesia está condenada e que os proletários se unirão para tomar o poder. Mas que até esse dia os dois, a aristocracia rural e a burguesia nacional, continuarão submetidos ao americano, o capital estrangeiro. Apesar de sua consciência, pede uma vela antes de morrer. Recebe uma vela das mais baratas e, falido, o Rei da Vela será enterrado em uma vala comum. A peça termina aos acordes núpcias do casamento de Abelardo II com Heloísa. O americano comenta: "Oh! Good Business!"
No texto, com grande poder de síntese, Oswald usa elementos que só seriam descobertos muito depois pela dramaturgia brasileira. Um deles é o rompimento com a ilusão teatral (sem ter lido Brecht). Assim, logo após a saída do cliente, Abelardo I afirma: "esta cena basta para nos identificar perante o público". Desse modo, a peça recusa-se a cair o ilusionismo teatral. Por sua vez, as personagens representam estágios de uma sociedade, não necessitando de diferentes nomes, desde que ocupem a mesma função. É o caso de Abelardo I e Abelardo II, ambos representantes de um mesmo setor da burguesia nacional. As figuras em cena caracterizam-se como anti-heróis, expressões negativas de um mundo decadente. E o texto é cheio de sarcasmos traduzidos em uma linguagem rica e brilhante que lhes confere uma ciranda de significados.
Resumo
No I ato, também aparecem Abelardo II, uma faceta de Abelardo I que tenta superar o “patrão”; Heloísa de Lesbos, noiva de Abelardo I por puro interesse financeiro; o intelectualPinote (e Oswald o usa para representar a situação dessas pessoas no país: ou se vendiam à burguesia, ou realmente lutavam pelo seu ideal). E, por último, Mr. Jones, representando o capital estrangeiro.

O II ato se passa na ilha tropical na Baía Guanabara que Abelardo I comprou para efetivar seu matrimônio com Heloísa. A família da moça é cheia de particularidades, a começar por ela, que se abre em encantos para Mr. Jones, mesmo na frente do noivo. Totó Fruta-do-Conde, seu irmão, é homossexual e “roubou” o amante da irmã Joana, apelidada de João dos Divãs. O outro irmão, Perdigoto, é viciado em jogos e bebida. D. Cesanira, a mãe, parece cair facilmente na conversa mole do futuro genro. Por último, o pai, coronel Belarmino, representa a decadência da aristocracia rural.
Heloísa aparece em franca camaradagem amorosa com Mr. Jones. Oswald utiliza a técnica da concentração de personagens com desvios (em geral sexuais) em uma só família para explicar a decadência da aristocracia rural. Assim, Heloísa de Lesbos possui, como o próprio nome indica, tendências homossexuais. D. Cesarina, sua mãe, mostra-se francamente acessível às investidas amorosas de Abelardo I.Totó Fruta-do-Conde, o irmão homossexual, acaba de roubar o amante da irmã, Joana, sarcasticamente apelidado João dos Divãs. O coronel Belarmino, pai de Heloísa e chefe da família, suspira por um mundo em decadência, o mundo da aristocracia rural. E Perdigoto, outro irmão da moça, bêbado e jogador, é um fascista que planeja organizar uma "milícia patriótica" para conter os colonos descontentes - idéia que interessa a Abelardo I, desde que ela possa ser utilizada para a manutenção da ordem social de que depende sua riqueza.
Os desvios sexuais continuam sendo identificados com a decadência da aristocracia rural. O americano interessa-se pelo chofer e, finalmente, D. Poloca, pilar das tradições aristocratas e virgem com mais de sessenta anos, sente-se tentada a passar uma noite com Abelardo I.

O último ato, tortuoso e alegórico, se passa novamente no escritório de usura. Abelardo I foi roubado por Abelardo II e quer se matar. Antes de morrer, ele pede com dificuldade uma vela, e Abelardo II oferece uma das mais baratas do mostruário. Abelardo I lembra a Heloísa que ela se Abelardo II, o ladrão. Morre o homem, mas o sistema permanece. Antes de morrer, Abelardo I mostra-se uma personagem consciente ao discutir com Abelardo II, garantindo que a burguesia está condenada e que os proletários se unirão para tomar o poder. Mas que até esse dia os dois, a aristocracia rural e a burguesia nacional, continuarão submetidos ao americano, o capital estrangeiro. Apesar de sua consciência, pede uma vela antes de morrer. Recebe uma vela das mais baratas e, falido, o Rei da Vela será enterrado em uma vala comum. A peça termina aos acordes nupciais do casamento de Abelardo II com Heloísa. O americano comenta: "Oh! Good Business!"

Heloísa representa a ruína da classe fazendeira. Seu pai, coronel latifundiário, vai à falência, num retrato em que predomina a perversão e o vício, símbolo de uma classe em decadência. A aliança de Abelardo e Heloísa pode, assim, representar a fusão de duas classes sociais corruptas pelo sistema capitalista.
Até mesmo a escolha dos nomes é irônica: Abelardo e Heloísa são dois famosos amantes da Idade Média: ele, um teólogo francês de século XII, ela, sobrinha de um sacerdote. Pouco tem a ver, portanto, com as personagens oswaldianas. Entre os noivos de Oswald, não há idealismo: Heloísa casa-se por interesse, fato sabido por Abelardo I, que também vê vantagens na aliança. Na verdade, Heloísa é membro de uma família da aristocracia rural falida e Abelardo I, da burguesia em ascensão. O casamento entre ambos é uma metáfora: com ele, Oswald simboliza a união entre essas duas classes sociais.

Escrito a partir de 1933 e publicado em 1937 pela primeira vez, o texto só foi encenado trinta anos depois pelo Grupo Oficina, talvez por seu modo descarado e atrevido de contar a história de um período complicado do país.

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